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Tens medo de quê?

Atualizado: 16 de mar. de 2021

há muitos tipos de medo

incluindo o tipo de medo que, na realidade, não é medo



o medo “puro” (aquele que não construímos, que não elaboramos, que não aprendemos) é uma resposta rápida do nosso organismo a um estímulo que, em pouquíssimos segundos, se confirma ser um perigo real ou não:


um som súbito, que afinal não era nada


um carro a aproximar-se a uma grande velocidade, quando estamos no meio da passadeira


alguém a aproximar-se com uma arma apontada




curiosamente o medo que sentimos nestes momentos é bem diferente do que experimentamos no dia-a-dia, daquele «tenho medo de não ser amad@», «tenho medo de estar a tomar uma má decisão»…

este medo que sentimos torna-nos altamente presentes, ligados e conectados. todo o nosso corpo está pronto a reagir. o tempo parece ficar em câmara lenta, a visão e audição mais apuradas, o foco da atenção bem dirigido e mantido. pensamos pouco e linearmente. [não me lembro de alguma vez ter sido assolada por dúvidas, angustias ou ambivalências nesses momentos.]

o que vem depois “deste medo” depende do desfecho do episódio… mas há um depois. poucos minutos após ter chegado, este medo vai e dá lugar à resposta emocional que o seu desfecho pede… alívio, perda, dor, riso, luta, acção, cooperação...


a maioria de nós, felizmente, vive poucos episódios de “medo puro”…

paradoxalmente, há muitas pessoas a descreverem, com muita frequência, um género de estado de “medo basal”… um género de modo básico de funcionamento:


«tenho medo do que as outras pessoas pensam de mim»

«tenho medo que os meus filhos não “vinguem” na vida»

«tenho medo de ficar sozinh@»

«tenho medo de não conseguir fazer isto sozinh@»

«tenho medo de estar doente»


este “medo basal” em pouco, ou nada, se parece com aquela resposta de medo que o nosso corpo prontamente dispara na presença de um perigo real (ou que assim pareça!)

este “medo basal” tem objectos que aprendemos a temer, tem conteúdos que nos habituámos a deslindar… pensamentos, comportamentos, frases… que vamos repetindo e que se retroalimentam, num frenesim mais ou menos intenso

quando o fazemos por tempo suficiente e com intensidade suficiente, o nosso corpo acaba por responder como se estivéssemos perante um perigo real (mesmo quando estamos perante um cenário que criámos mentalmente, consciente ou inconscientemente, no teatro da nossa cabeça). a diferença é que, neste, o tempo de duração desta experiência pode ser muito longo. desde alguns minutos, a horas, dias, semanas, meses…


estamos acostumados a assustarmo-nos, a meter medo a nós próprios, com o que pensamos, com o que dizemos. evocamos imagens e hipóteses que geram medo do que não aconteceu, mas que poderia ter acontecido. medo do que ainda pode vir a acontecer, mesmo que possa nunca chegar a acontecer. um medo subtil e ansioso, permanente e mesquinho, quizilento, chato, ruminante e irritante. assustador e desgastante.


quando passamos muito tempo nessa ansiedade criada e permanente, a resposta de medo do nosso corpo deixa de ser uma resposta adaptativa e protectora. passa a ser uma resposta corrosiva e limitadora.


este tipo de "medo basal" é, na realidade, uma preocupação... não é medo real, útil e adaptativo, que nos prepara para lidar com o perigo; é um estilo de abordagem à realidade que nos foi ensinado. fomos programados, treinados para anteciparmos os piores cenários, para nos prevenirmos e prepararmos para lhes responder atempada e assertivamente.


vigilantes, prontos, preocupados.


até «parece mal» não exercer este tipo de cuidado preliminar, que nos permeia com o título de mães e pais extremosos, de pessoas cautelosas e racionais, de espertos e prevenidos.

de títulos em riste, com a medalha ao peito, o fardo pesa demasiado. impede-nos de confiar, de nos entregarmos, de conhecer a experiência da vida. da vida, tal como se apresenta, sem o véu da preocupação [a que vamos chamando medo]…

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